Cansaço Materno
“Mãe, você precisa de cuidados!!” Este texto é um convite para que as mães se permitam ouvir seu cansaço e suas angústias para que possam, a partir de uma escuta acolhedora, cuidarem de si mesmas. Queixar-se de cansaço materno, não se trata de queixar-se do fato de “ser mãe”, mas da sua humanidade de ter direito a ser vulnerável e de necessitar também de cuidados e apoio.
A proteção e os cuidados para com as mães é tão necessário que estudos indicam que negligenciar o cansaço materno, principalmente no pós parto, pode levar a exaustão, passível de desenvolver o chamado Mammy Burnout ou Burnout materno. A Síndrome de Burnout, caracterizada como um esgotamento profissional desenvolvido a partir de situações de trabalho desgastante e de excessivas demandas de trabalho, pode levar as pessoas a buscarem ajuda profissional, podendo chegar a um afastamento das atividades laborais. No caso do Burnout materno, esse esgotamento se desenvolve a partir das rotinas sobrecarregadas das mães, na busca de desempenhar as funções de forma a garantir o bem estar de seus filhos. Não é causado pela maternidade em si, mas pelo acúmulo de responsabilidades e excesso de tarefas.
Em se tratando de responsabilidades, não se pode esquecer que, no início da vida, mãe e bebê estão tão interligados que o mal estar da mãe acaba comprometendo sua relação e o comportamento do seu bebê. Esta interdependência aponta que, ao cuidar de si mesma, a mãe também estará cuidando de seu bebê.
Antes de adentrarmos o território da relação mãe/filhos, é importante diferenciar que a maternidade trata mais da relação consanguínea entre a mãe e seus filhos. Neste texto, estamos falando da maternagem, que é o cuidar afetivo e integral de outro ser humano que se encontra vulnerável e ainda em processo de crescimento e desenvolvimento. Desta forma, o maternar ganha uma abrangência muito maior e capaz de incluir relações mãe e filhos além da consanguinidade. Lembrando que, infelizmente, existem mães que apresentam dificuldade em oferecer uma verdadeira maternagem a seus filhos, seja por dificuldades emocionais ou outros comprometimentos psiquiátricos.
Para algumas mulheres a vivência da maternidade com a devida maternagem, pode estar entremeada por sentimentos inquietantes, menos compartilháveis, levando-as a uma sensação de inadequação e isolamento. Sua capacidade para se doar afetivamente a seus filhos está disponível. No entanto, seu cansaço pode estar comprometendo sua própria saúde emocional.
Uma dificuldade emocional bastante frequente e também já muito discutida é a culpa materna, ou seja, a sensação que toda mãe tem de não estar fazendo o suficiente. Seja por não estar percebendo, se envolvendo, compreendendo e/ou amparando o suficiente. Esta culpa, que espreita o sentimento da maioria das mães, torna-se intensificada quando a questão profissional entra em jogo, acarretando novos e diferentes impasses.
Muitas mães optam por interromper temporária ou permanentemente suas carreiras para cuidarem de seus filhos. Uma escolha delicada, que envolve uma intrincada gama de emoções conflitantes. Uma vez que estas mulheres priorizaram a convivência integral com seus filhos, acabam por atrelar sua qualidade enquanto pessoa ao desempenho de seus filhos. Algo como se o sucesso deles validasse sua existência. Há uma angústia, uma mescla de sua vida com o desempenho de seus filhos. Nesta equação mães e filhos acabam sobrecarregados.
Não menos conflituosas são as angústias daquelas mães que escolhem ou precisam manter suas carreiras. As mães que “trabalham fora” trazem a sensação de permanente dívida. Permanente cobrança sobre a quantidade de tempo que estão dispensando aos filhos. Este talvez já seja um tema recorrente nos questionamentos sobre a maternidade na modernidade, mas as angústias maternas podem trazer nuances ainda mais sutis, menos perceptíveis. E, no decorrer dos anos, vão se desvanecendo e se tornando lembranças felizes, esquecidas quando os filhos crescem. Mas, enquanto os filhos são pequenos, na lida diária com suas demandas incessantes, podem vivenciar um profundo desamparo. Um exemplo de uma situação que é comumente esquecida, é a sensação de solidão que algumas mulheres sentem ao acordar de madrugada com um bebê que não adormece em seu colo, apesar de todas as suas tentativas de niná-lo. Um momento solitário, no qual todos dormem e a noite fica um silêncio ensurdecedor.
Cansaço da vigília, precariedade de sono, a entrega contínua e o cuidado permanente vão trazendo uma sensação de esvaziamento de si mesma. É como se a vida se restringisse ao cuidar e como se toda a vida, enquanto pessoa, estivesse esquecida e, para muitas, perdida. O que torna estas vivências tão conflitantes é justamente a presença do amor que entremeia esta dedicação. Não podemos nunca esquecer que o amor está presente para a maioria das mães, mas o amor pode coexistir com cansaço e conflitos.
Um evento diferente, que pode estar agravando as cobranças sobre as mães e seus filhos é o advento das redes sociais. Nelas, fotos de famílias aparentemente perfeitas são compartilhadas, assim como o sucesso de filhos podem ser expostos, gerando a sensação de que nossas vidas e nossos filhos estão sempre aquém daquilo que se considera aceitável e valorizado pela sociedade. A partir destas interferências virtuais, acrescida das muitas pesquisas no Google, percebe-se uma angústia crescente nas mães que encontram-se expostas a novos modelos de referência e parâmetros de comparações, que as deixam inseguras. Insegurança sobre o desempenho cognitivo, sobre a saúde psíquica ou, ainda, sobre o nível de socialização de suas crianças. A maternidade, agora, vem ganhando tantos matizes novos. E, por efeito da modernidade, tem se tornado tão mais solitária, já que as redes de apoio, que antes amparavam as jovens mães, está cada vez se tornando mais rara. As avós, tias e madrinhas estão se tornando, igualmente, menos disponíveis, por ocasião da precariedade de tempo de suas próprias vidas.
Trazer à luz as angústias da maternagem não tem a intenção de desestimular a maternidade, nem tão pouco trazê-la como algo ruim. Mas é para dar voz às mães sobre a possibilidade da coexistência de seu amor com suas angústias e frustrações. Reforçando a ideia de que é o amor que torna toda a maternagem possível.
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